Quando o gênero vira performance
E os evangélicos se tornam o que mais criticam
Será que uma cristã pode ser menos ou mais mulher? Será que um cristão pode ser menos ou mais homem?
- Preciso ser mais mulher. Preciso parecer feminina. Preciso mostrar que sou uma mulher de verdade. Me esforço, me esforço, me esforço.
Nessa era performática, nós, evangélicos, mordemos a isca dos perigos do nosso tempo: transformamos o sexo que Deus no deu em performance. A partir do desempenho de cada mulher (seja com sua aparência, trabalho ou família), dizemos o quanto ela realmente é mulher. E o mesmo fazemos com homens, que precisam ser fortes e ricos para serem “homens de verdade”. Sim, não é um problema novo, mas as exposições midiáticas provocaram um aumento exponencial na exigência da performance.
No fim, nos tornamos quem mais criticamos: Já que não encontramos estabilidade nos valores da sociedade, começamos a entender nossa sexualidade como algo fluido, que precisamos conquistar e performar, e não como algo dado por Deus. E isso é terrível.
Como assim? Explico. Na teologia luterana existe um lema muito pertinente: primeiro indicativos; depois, imperativos. Eu só consigo fazer o que devo fazer quando recebo o que Cristo já fez por mim. Só consigo obedecer porque ele, primeiro, me alcançou e me salvou. E nossa sexualidade não é muito diferente disso:
Deus me fez mulher. Ponto. Ele me criou uma mulher. Não posso mudar isso, não posso ser mais ou menos algo que ele mesmo me presenteou. Não há estereótipo ou coisa alguma que mude isso. E quando entendo minha sexualidade como um presente, tudo muda. Tudo fica mais leve. Eu posso alegrar em quem Deus me fez; eu não preciso conquistar nada. Eu sou uma mulher amada por Deus mesmo com cabelo despenteado ou com o arroz queimado. E ainda que eu não casasse e não tivesse filhos, eu jamais poderia ser menos mulher. Um homem, também, jamais seria menos homem se estivesse desempregado ou acamado.
Nosso sexo não é uma “missão” da qual precisamos estar à altura. Simplesmente é.
Lutero, explicando o primeiro artigo do Credo (Creio em Deus Pai…) em seu Catecismo Menor, diz o seguinte:
Creio que Deus me criou junto com todas as criaturas, e me deu corpo e alma, olhos, ouvidos e todos os membros, inteligência e todos os sentidos, e ainda os conserva; […] E faz tudo isso unicamente por ser meu Deus e Pai bondoso e misericordioso, sem que eu mereça ou seja digno.
Por muito tempo (especialmente na adolescência), me sentia diferente das outras meninas. Será que Deus havia me criado errado ou com efeitos? Muitos anos depois, recebi o “diagnóstico” de Altas Habilidades e comecei a entender mais sobre neurodivergências. De qualquer forma, muito antes, eu já havia entendido que Deus havia me dado minha sexualidade e nenhum estereótipo faltante poderia mudar isso.
Quantos adolescentes ou jovens que hoje seguem a ideia de não-binarismo poderiam ser ajudados com essa ideia?
Deus me fez mulher, e isso é um presente. Ponto. Obrigada, Senhor.
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📖 Mais um livro do autor Miroslav Volf (um dos meus teólogos favoritos) foi lançado no Brasil: O custo da ambição. Nós entrevistamos o autor e conversamos sobre o livro no canal do Zé Bruno. Leiam tudo desse homem!
🎵 A música O Nosso General é Cristo, regravada pelo Morada, daria uma ótimaaa abertura de anime.
Notícias 💬
Nosso clube do livro sobre O homem e a mulher segundo Paulo, de Cynthia Westfall, conta com mais de 50 participantes! Na quinta-feira (02/10), tivemos um encontro muito especial com a própria autora. Que jornada gratificante ler o livro com este grupo!




Muito bom a reflexão